sexta-feira, maio 23, 2008

O surf é um esporte caro...

Uma onda dessas merece um simples toco de terceira mão? Ou é preciso uma pranchinha ideal para se dar bem? Foto: Fonte desconhecida.

Quanto custa o esporte?

Essa pergunta não sai da minha cabeça há muito tempo. Estive pensando muito sobre o assunto e gostaria de compartilhar alguns pontos que são relevantes para poder explicar.
No entanto, gostaria de voltar uns 20 anos no tempo e lembrar de como as coisas eram quando eu comecei a surfar. Algumas pessoas se identificarão imediatamente com os fatos que apontarei, outras, mais novas, certamente acharão graça e não terão a mínima idéia de como as coisas eram realmente.
Lembro da primeira prancha que comprei, ah como ela era linda, uma prancha da Litoral Sul, nas cores amarela e laranja. Comprada de um amigo já falecido com pagamento parcelado em algumas vezes através de um compromisso de fio de bigode, embora, eu nem tivesse ao menos sinal de bigode, pois tinha apenas 13 anos de idade. Aquela prancha era a “minha” prancha que estava pagando com o meu esforço e suor. Porém a bendita precisava de uns reparos e como eu estava fissurado para entrar na água, acabei emprestando do cunhado de outro amigo uma Surfline quebrada e remendada no meio e tão pesada quanto uma bigorna. Aquela Surfline pintada de um vermelho tosco, a fim de esconder o enorme remendo, foi a primeira experiência que tive dentro do esporte e foi nela que dropei os primeiros caixotes que quebravam na Castelinho e Araçá. Foi com esse mesmo toco que peguei a primeira parede da vida, também no Castelinho. Naquela época roupa de borracha era coisa para poucos felizardos ou abastados. No máximo uma lycra para espantar o frio causado pelo gélido vento sul no auge do inverno. E podem ter certeza, foi uma época feliz, em que curtíamos uma longa caminhada pelo caminho da granja para chegar à Praia do Porto e aproveitar aqueles finais de semana frios dos anos 80. Quantas caronas de carroça nós ganhamos e ficávamos radiantes? Apesar da demora do bichinho que a tracionava, era uma maneira de economizarmos algum trocado, energia para o surfe e para a longa volta para casa. Algumas vezes arriscávamos uma pernada até a Praia D’água a fim de conferir as ondas que víamos marchando lá fora. Geralmente pegávamos altas ondas com no máximo 05 ou 06 cabeças na água.
Para arriscar um banho na Ribanceira, aí só mesmo de monareta, caloi-cross ou barra circular (quem podia, podia) que era a “power bike” da época.
Resumindo, surfar para um garoto de 13 anos, em qualquer um dos picos acima, era uma verdadeira aventura, sem contar o frio de rachar taquara verde.
Mas foi através dessas vivências que pudemos dar valor às pequenas coisas que íamos adquirindo com muito esforço e sacrifício. Lembro da minha primeira roupa de borracha que comprei do Walter “Tate” Pacheco, um long jonh preto com amarelo, que mais parecia uma carga de algodão, depois de molhar parecia pesar uma tonelada. O zíper estava detonado e precisava usar uma segurança para fechá-lo. Eu ficava rezando para aparecer alguém quando estava entrando e saindo da água para poder abrir ou fechar a maldita segurança.

Surf Trip de 1980 à Praia do Rosa. Não era qualquer um que podia se dar ao luxo de uma barca dessas. Foto: Frame de um Super 8mm. Ângelo Possenti.

Hoje, olhando e relembrando essas pequenas coisas tenho certeza que tudo aquilo e todas aquelas roubadas em que nos metíamos valeram a pena e foram um ótimo alicerce para o espírito e para o caráter de todos que as vivenciaram.
Nesses 20 anos muita coisa mudou dentro do surfe. O esporte foi reconhecido e se expandiu pelos quatro cantos do Brasil e do mundo, mas os produtos surfwear, apesar da grande massa consumidora, continuam com preços que beiram o inacreditável, para padrões brasileiros. O que em muitos casos impossibilita às novas gerações de se aventurarem no surfe.
Senão vejamos:
Uma prancha nova não sai por menos de R$ 600,00 (seiscentos reais);
Uma capa para prancha custa no mínimo R$ 100,00 (cem reais);
Uma cordinha custa em torno de R$ 70,00;
Uma roupa de borracha (long jonh) custa no mínimo R$ 400,00.

Ou seja, se um garoto hoje quiser se iniciar no mundo do esporte deverá desembolsar, vamos arredondar para facilitar as coisas, a pequena bagatela de R$ 1.200,00 (hum mil e duzentos reais). E gostaria de ressaltar ainda, que isto é apenas para praticar o esporte. Se o garoto quiser se vestir com a moda surfwear pode preparar o bolso, pois a fatura será muito mais alta. Parece pouco? Pergunte a qualquer garoto de 14 ou 15 anos se ele dispõe dessa quantia para investir inicialmente em um esporte.

Quiver de responsa. Quantos garotos podem ter um desses? Foto: ASP Tostee/Covered Images.
Enquanto no futebol qualquer moleque pode iniciar nos campos de várzea correndo descalço atrás de uma “pelota”, feita até de meias, no surfe a realidade é bem diferente. Claro, que há opções mais em conta, e dentro das inúmeras possibilidades, existem as pranchas e roupas de segunda mão. E essa, “infelizmente” é a realidade Brasileira. Começar com produtos de segunda ou terceira mãos.
Para mim a impressão que dá é que o mercado surfe brasileiro está trilhando um caminho contrário na busca do desenvolvimento de base, elitizando os praticantes através de preços que a grande maioria da população não pode pagar. A diversidade de marcas e produtos ao invés de baixar os preços nivelou-o por cima. Enquanto isso, na Austrália, que vive outra realidade econômica, a molecada continua praticando desde a infância o esporte número um do país, o surfe. E os preços estão dentro da real possibilidade de compra dos iniciantes, sem produtos de segunda ou terceira.
Enquanto isso, para nós, “canarinhos”, o surf é um esporte caro.
Aloha,

Beda Batista
2BSurf

2 comentários:

Anônimo disse...

Éééééé, o surf realmente é um esporte caro... guardando as devidas proporçòes, passei também por algumas roubadas. Tive a felicidade de ganhar, aos 12 anos, uma prancha de meu pai, porém na invernada,usava um short com manguinha "enjambrada" por baixo e um long john de mergulho cavado de mergulho por cima.. muiiito pesado... nem dava nada! Ia de Itapirubá para Zimba, de busão,na praia dágua... pedindo informaçào nos butecos, mercados e "pegando" presunto e queijo e comprando o pào.. na época e ainda hoje, acredito que "furto famélico"náo é crime... É esporte caro para iniciantes... mas com certeza todo investimento vale a pena. Abraços.

Anônimo disse...

É uma pena que a indústria do surf ainda nivele os preços acima da realidade tupiniquim, mas falta investimento também do governo em dar oportunidades aos menos favorecidos e incentivar o esporte, assim como faz com o futebol, como a loteria da Timemania... Mas a solução... ou abaixem os preços, ou aumentem nossos salários!!!